The Understanding?

(Imagem: Link)


É agora veneno, o que outrora fora mais doce que o mel dos lábios de um adolescente apaixonado.
Continuam a fervilhar de saudade, os locais que um dia conheceram o sabor da mais explosiva e insana mistura de amor e loucura de que há memória.
Do vazio que resta nas paredes outrora preenchidas pelos posters de uns vulgares heróis dos dias de maluquice, brotam agora imagens de outros tantos, menos convencionais, mais maduros, diz ele. "Inspira-te no poderio das suas vozes, na energia das suas letras e na mensagem de auto-confiança que transmitem, e serás feliz".
Não era. Nem feliz, nem confiante, nem sequer chegava a ser alguém, em boa verdade. Não passava de um espectro deambulante, alimentado pelas memórias de um passado, cruéis e devastadoras como sempre, como nunca. Afinal, ela havia vencido, por fim. Transformara-o num monstro ainda pior do que ela fora, durante aquele conturbado período de convivência mútua em que aproveitara para lhe sugar compulsivamente a vitalidade, até que dele mais não restou senão isto que aqui vêm.
E depois, o ciclo vicioso do costume. A tentativa de não pensar, que acarretava sempre consequências piores, como a ausência de humanidade e os consequentes problemas a todos os níveis que daí advinham.
Não fora o apoio dos únicos de sempre, e esta carta jamais conheceria a luz do dia.
Afinal, a cura nunca esteve perto de acontecer. Nenhum antídoto é suficientemente poderoso, pelo que o dia do fim ocorrerá inevitavelmente.
Por mais que te custe, nem tu que és um anjo na terra, serias jamais capaz de espremer deste cérebro esclerosado alimento suficiente para ressuscitar o que um dia existiu dentro de um coração que há muito deixou de bater. Antes de ti. Antes de tudo o que algum dia valeu a pena.
Por mais cartas que escrevas, o mais que resta é a memória de algo bom que um dia sentiste. Usa-a, para na vida triunfares, e a memória deste velho homenageares, no dia em que a chuva se misturar com as lágrimas, naquela planície relvada, onde os pássaros chilreiam e a sua música favorita o fizer sorrir onde quer que esteja, de polegar bem elevado e lábios sorridentes em sinal de um sincero Obrigado por tudo o que de bom lhe proporcionaram, todas as pessoas que algum dia deram tudo o que tinham para o fazerem sorrir, simplesmente.

Foi apenas isso que valeu a pena. Nothing else matters...

A Tippler's Journey

(Imagem: Link)



Incessantes caminhadas que conduzem a lugar nenhum, lentas e planeadas ao sabor de uma qualquer ressaca, das habituais, das muitas e incontáveis das quais já perderam a conta. Do estado de embriaguez permanente já nenhum proveito tiram, tal é a força do hábito, que lhes consome as vidas como um qualquer animal selvagem sedento do sangue da sua próxima presa.

São assim feitas diariamente, à mesma hora e no local habitual. Do hall de entrada à nobre casa de banho, mil conversas surgem, mil conversas terminam sem o mínimo sentido aparente. Curiosa, a mente humana. Esse bicho do mato que a ciência teima em não conseguir desmontar e esmiuçar de forma suficientemente clara e sucinta, que permita ao comum mortal compreender os porquês de certas e determinadas atitudes dos seus semelhantes...

Sussurrantes, de passo vagaroso e irregular, tentais esconder o óbvio. Mas... Sereis capazes de enganar-vos a voz próprios?
Senhor A e senhor B, porque caminhais vós afinal?

O vinho... É o vinho que movimenta as vossas pernas, solta as vossas línguas e preconiza a vossa real desgraça. Cadáveres ambulantes, moribundos sem eira nem beira, perdidos por um copo maldito do elementar néctar que das natureza brota e a ela vos devolverá em breve, sete palmos abaixo da (i)rreal raiz do vosso mal supremo.

Engraçado, como é fácil brincar com as palavras, sempre que da desgraça humana se trata... É esta a minha especialidade. Quiçá, consciente da minha própria sentença de morte, ao exprimir neste local opiniões mordazes (retratos fidedignos?) sobre a vida alheia.

Que hei-de eu fazer? Pegar na foice do símbolo e com ela corrigir o bem mal feito? Ou o mal bem feito? Dizei-me vós, de vossa justiça. Estou demasiado consumido por esta minha forma de ser, incapacitado para dos seus benefícios/malefícios aquilatar, com suficiente discernimento para dela fazer opinião...


A Uma Guitarra

(Imagem: Link)


Guitarra desafinada, clama em vão pelas mãos experientes que hão-de afinar-te e devolver-te o timbre perfeito que tu própria já esqueceste.
Propaga o teu som pelas sombras dos mais inóspitos recantos do mundo. Serás feliz logo que anoiteça e os sons da morte preencham os sonhos dos homens. Afinal, foram eles que te criaram...
A galope das tuas cordas muitos sonhos nasceram, para morrerem antes sequer de serem vividos. Foste a origem de muitos males, mas não tiveste culpa. Quem te fez assim tão perfeita jamais imaginou que o Apocalipse de muitos surgiria assim, entre riffs e acordes mais ou menos trabalhados, tanto faz.
Não foste criada para decidir nada, por isso não tens de te preocupar. Pensa antes que a utópica felicidade que em compensação proporcionaste, ainda que efémera, compensou tudo o resto.


My dream is to fly, over the rainbow, so high... So high...


(Texto escrito no decorrer de um qualquer trip mental, ao som de uma guitarra - o instrumento mágico que tem o poder de mexer comigo, para o bem e para o mal, sempre que o virtuosismo do instrumentista extravasa os limites do vulgar, do que é exemplo o vídeo publicado no post anterior.)

Lonely Day



Um fim de semana inteiro sem sair de casa, e dá-me para isto. Podia ser pior...

O Pequeno Demiurgo


Escrevo
barco e uma quilha fende o vastíssimo mar
e as arvores crescem dos espaços enevoados
entre olhar e olhar movem-se
animais presos á terra com suas plumagens de ferro
e de orvalho de ouro quando a lua se eclipsa
comunicando-lhes o cio e a nómada alegria de viver

penso outono ou inverno
e o lume resinoso dos pinhais escorre sobre o rosto
sobre o corpo em tímidos gestos
eis o tempo
do capricórnio reduzido ao esconderijo tatuado
na asa mineral da ave em pleno voo e digo nuvens
relâmpago, erva, águas
homem
movimento do susto, oceanos, sal, exaustos corpos
transumantes paixões digo
e surge , irrompe, escorre, ergue-se, move-se, vive
morre
mas não julguem ser trabalho simples nomear
arrumar e desordenar o mundo

para que não se apague esta trémula escrita
preciso do sonho e do pesadelo
da proximidade vertiginosa dos espelhos e
de pernoitar no fundo de mim com as mãos sujas
pelo árduo trabalho de construir os gestos exactos
da alegria que por descuido deus abandonou ao cansaço
no fim do sétimo dia.


(Al Berto)

Capítulo I - O Julgamento

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Tão pequenas, que ridículas. As coisas, aquelas que servem para fazer esquecer por momentos a mediocridade dos dias. Obrigado à misteriosa menina da "terra das tias", pelo riso momentâneo que me proporciona, a cada novo capítulo de uma novela cujo fim em breve conhecerei.

Mas...

Tantos anos de desilusões deviam permitir-lhe, ao menos, erguer à sua frente o escudo protector que o impediria de cometer os mesmo erros do passado. Como está feliz, sente-se o maior, como quem diz "Ah! Já caí nesta uma, duas, cinco vezes. Agora não me apanhas mais!"...
Pobre idiota. Nem sequer se apercebe da quantidade de vezes que é necessário ser-se espezinhado, até ser possível aprender a lição. Será mesmo? Existem pessoas que nunca aprendem...

E eu, que sei, digo: maldito seja o coração.

Acercai-vos. Colocai, todos, as vossas mãos entrelaçadas, e perante a minha cabeça deixai-as cair, para que sinta o tremendo peso do seu julgamento. Permito que o façais, que me julgueis, uma vez na vida. Afinal, não é todos os dias que se cai no conto do vigário, quando se foi o inventor do dito. Quando o próprio vigário somos nós! É preciso ser muito idiota, não é? Digam lá que não.

Afinal, a miragem está mais perto de deixar de o ser. A cada palmo de terra trilhada em nome de ninguém. Por cada centímetro de alcatrão inutilmente percorrido, chorareis para sempre o remorso, pela culpa, da minha morte...