The Final Countdown...

(Dimensions of Time, by NadavDov, deviantart.com)



É uma dor tão forte, que deixou de ser apenas espiritual... Alastrou como um vírus, e aos poucos vai consumindo também aquele corpo inerte.

A "ferrugem" vai corroendo as engrenagens, lentamente, e pouco a pouco vai ficando mais próxima, da tal máquina que tudo controla e que até então se tinha recusado a parar. Terá de o fazer um dia, pensava ele... Só não tinha prevista a possibilidade de não ser ele próprio a escolher esse mesmo dia, como havia planeado vezes sem conta... E essa perspectiva, mais do que qualquer outra, assombrava-lhe os dias e as noites, absorvendo implacavelmente os resquícios da tal sanidade que ainda tinha (por mais inacreditável que fosse, o facto de ainda restar alguma).

E assim, mergulhado no pesadelo da incerteza, passava os seus dias a pensar... Como teria sido a sua vida, se tivesse escolhido outro caminho que não aquele... E como seriam as vidas dos que lhe eram mais próximos, depois da sua partida.

E esta pessoa sou eu, meus amigos... E ao contrário do que possam pensar, isto não é só mais um devaneio desta mente tão débil. Vou mesmo morrer-vos, e quando eu já cá não estiver para vos contar histórias, espero que durante todo este tempo as minhas palavras tenham servido para alguma coisa, quanto mais não seja, para que não tenham dado por perdido o tempo que aqui passaram, a ler tais extravagâncias... ... ...

Lítio

(damned, by KarateSchnitzel, deviantart.com)


Se ele pudesse, àquele sangue tão débil misturar um qualquer composto energético que o fizesse fluir de novo, viver de novo...

Como ele gostava, de sobre quem lhe sugou a vital essência descarregar toda aquela ira! Nunca antes havia gostado da palavra vingança, porém naquele caso tratava-se quase de um crime que deveria ser punido a qualquer custo... Se nada fez para o merecer, pensava, não deveria ser o alvo da chacota daqueles que, julgando-se a fina flor da societé, mais não eram senão o que de mais sujo e obsceno esta podia oferecer. E se o desprezo é por vezes o melhor antídoto para tais venenos, naquele caso o mesmo não se aplicava - e a tal vingança, que fervilhava dentro de si com a hipótese de ser liberta a qualquer momento - apresentava-se como sendo o desfecho final da história que se arrastava à tempo demais.

Como um velho manuscrito, perdido no tempo, do qual foi rasgada propositadamente a página principal, inutilizando-o... Era assim que se sentia em relação à sua própria vida. Sentia que jamais poderia ser, de novo, completo... E a sua sina, em boa verdade, era precisamente essa: saber que tinha de prosseguir em frente, ainda que a sua vontade não fosse, de todo, tal...

Serenidade - Utopia?

(dark abide, by orangebutt, deviantart.com)



Inópia - quase inominável, aquela (sobre)vivência a que os seus mais queridos teimam em chamar "falta de vontade de mudar".

Mudar, mudar... Diz o dicionário que significa "dispor de outro modo". E eu questiono-me, amigos meus, de que outro modo é que eu hei-de dispor esta minha perpétua indisposição, como é que eu hei-de terminar o projecto que me atribuíram à partida, há vinte e tal anos atrás.
Ventos de mudança há muito que não sopram por aqui... Dos tempos em que por eles fui brindado, não restam senão mágoas e arrependimentos, pelas escolhas erradas que fiz, uma e outra vez... E se me dizem que nunca é tarde para recomeçar, eu pergunto-vos: PARA QUÊ?
Se em tantas hipóteses, nunca nenhuma aproveitei, porque seria diferente no futuro?
... Então, silêncio... Olham para mim com olhos tristes, os mesmos olhos conformados do médico que declara, impotente, a hora da morte do enfermo, depois de goradas as tentativas de o reanimar...

E eu rio, quando a vontade é chorar, e peço-lhes para se esquecerem de mim e seguírem em frente... Por mais egoísta que isso possa soar... E por mais que vos custe a acreditar, era esse o meu maior desejo... Apagar das vossas mentes a memória da minha existência, para que pudesse finalmente partir, sem remorsos, rumo à minha libertação final... ... ...

Memoirs of the Ruthless - Part II

Afagou-lhe o cabelo... Com aquele olhar penetrante tão seu, fitou-o durante uns segundos que mais pareceram horas. Foi naquele momento, naqueles instantes, que percebeu que tudo não passava de uma descomunal mentira, como era tão débil! As suas próprias insanidades dançavam ali, de mãos dadas, como se de uma ópera se tratasse - ela, a principal intérprete num passado fictício, e ele... ele era uma espécie de espectador, digamos - o executante dos Intermezzos.

Vagueando novamente, após a sua partida, pensava que nada daquilo era real... Indagava-se constantemente sobre a mesma e central questão: seria aquele doce veneno suficientemente forte para o arredar em definitivo da sua posição entre os não-esquecidos?

A resposta, essa, viria a sabê-la mais tarde... Tarde demais, tão tarde que a sua sombra não pairava já sobre a vida da responsável pelo seu FIM...

Memoirs of the Ruthless - Part I

"Observei esse teu palácio de tormentos... Quem to construiu, e porque nele vives?" - perguntaram-lhe.

A resposta não a sabia, naturalmente. Desde que nascera não conhecera outro refúgio, desconhecia as razões pelas quais alguém foi capaz de o fazer nascer, ali, naquele sítio maldito, e ali o aprisionou para sempre.
Os senhores do lugarejo apercebiam-se que algo se passava com aquele estranho ser que por ali vagueava, sem rumo - impotentes perante a sua dormência.

E ele lá continuava, consumido pela ânsia da sua morte eminente, pela vida que lhe passava ao lado, cada vez mais longe, tão longe... Envolto nos seus nojentos vícios, escrevia sem parar uma espécie de diário monológico que se arrastava indefinidamente, como se cada dia fosse o último. Mas nunca mais chegava, o dia, o tal dia pelo qual esperava há tempo demais...

Mother





Some anger, to start the month... His eyes, so full of rage... Just the same as in mine, too...