O Génio e o Medo




A escrita é a minha primeira morada de silêncio
a segunda irrompe do corpo movendo-se por trás das palavras
extensas praias vazias onde o mar nunca chegou
deserto onde os dedos murmuram o último crime
escrever-te continuamente... areia e mais areia
construindo no sangue altíssimas paredes de nada 
esta paixão pelos objectos que guardaste 
esta pele-memória exalando não sei que desastre 
a língua de limos 
espalhávamos sementes de cicuta pelo nevoeiro dos sonhos 
as manhãs chegavam como um gemido estelar 
e eu perseguia teu rasto (...) à beira-mar 
outros corpos de salsugem atravessam o silêncio
desta morada erguida na precária saliva do crepúsculo

[Al Berto - "O Medo"]